Considerado crime pela lei número 12.318, de 26 de agosto de 2010, a alienação parental tem sido cada vez mais utilizada como moeda de vingança pós-divórcio. “É quando a criança é usada, ao invés de cuidada”, conceitua o advogado Adonis Trindade.
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Conceito de alienação parental
A alienação parental é toda ação praticada por genitores, assim como por quem detenha sua guarda. “O objetivo é implantar falsas memórias no infante, visando destruir a imagem do outro genitor”, explica Trindade. “Toda ação que denigre a imagem que a criança tem do pai ou da mãe pode ser considerada alienação parental”.
O advogado lembra ainda que o autor pode ser punido com prisão preventiva e uma medida cautelar com a finalidade de impedi-lo a cometer novos crimes, por 180 dias. Igualmente, pode incidir em crime de desobediência quanto as medidas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Em casos mais graves, pontua Trindade, o autor pode perder a guarda, bem como o poder familiar. “Constatado o ato de alienação parental, o genitor vítima de alienação deve procurar o Conselho Tutelar, do mesmo modo, a vara da infância e juventude, para buscar orientações”.
Prejuízos emocionais da alienação parental
Segundo o advogado, alienação parental é também o ato de criar uma imagem negativa, “ou seja, que o pai ou a mãe abandonou, não ama, não gosta, não quer junto se si, ou que não o quis desde o momento da gestação”.
O adulto, explica Adonis, visa impedir ou destruir vínculos afetivos entre a criança e o prejudicado, por vingança. A psicopedagoga Marcela Nunes completa: ” Assim, acaba gerando no filho um complexo de rejeição e menos valia, que pode reverberar em todos os âmbitos de sua vida”.
Marcela Nunes, que trabalha com crianças diariamente, esclarece que o alienador posiciona o filho em uma realidade paralela, “nesse sentido, causa grande confusão entre o que é verdade e o que é simulado”.
Consequentemente, o infante perde a noção da realidade e não mais consegue distinguir o que é sentimento legítimo. “De repente a criança desenvolve sentimentos de ódio pelo genitor em resposta a conduta do alienador”, explica a psicopedagoga.

Nem tudo é alienação parental
Marcela lembra que, depois do divórcio, ambos os genitores terão novos relacionamentos. “Porém, o primeiro deles a engatar um namoro, pode desencadear no outro um sentimento de vingança”, explica. “Ele levará o filho achar que foi descartado, quando na verdade, em nada a criança tem culpa”.
A especialista lembra, no entanto, que nem tudo é alienação parental. Ela sugere enfim, um caso no qual foi mediadora: Maria namora José (nomes fictícios), que impõe ao filho que chame José de pai.
Em agosto de 2020, o menino, de oito anos de idade, fez um presente para o Dia dos Pais durante uma atividade online da escola. Ele afirma ter sido orientado pela mãe a presentear José.
A psicopedagoga conta então que o garoto, constrangido, contou ao pai biológico que gostaria de dar a ele, mas foi impedido pela mãe. Este pai entrou na justiça alegando alienação parental, que a mãe estaria agindo de má-fé, tirando dele os direitos de pai. A justiça entendeu que a atitude da mãe não caracterizava eventualmente alienação parental.
“Pode representar a vontade de criar um laço afetivo apenas”, pontua Adonis Trindade. “A busca por laços afetivos não representa violação ao direito do pai ou da criança”.
Ele enfatiza: “configura alienação parental, entretanto, a destruição da moral do outro com palavras e ações como ‘ele não presta, seu pai e um bêbado, drogado, perigoso’.”.

Filhos como instrumentos de vingança
A alienação parental é decorrente da fragilidade na elaboração da separação, no luto do relacionamento amoroso perdido de um dos membros do casal, segundo Maria Berenice Dias. Ela é ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
Ela afirma que a pessoa usa de vingança pelo sofrimento vivenciado ou de chantagem para tentar uma reconciliação. “Ou por benefícios financeiros, encontrando no filho uma ferramenta poderosa para agredir afetivamente o ex-parceiro”.
Sobretudo, quando não há uma elaboração adequada do luto conjugal, vê-se a destruição, a desmoralização e o descrédito do ex-cônjuge. Os filhos são levados a rejeitar o genitor, a odiá-lo, , lamenta Dias. “Tornam-se instrumentos da agressividade direcionada ao parceiro”.
Inicia-se, então, um processo de destruição dos laços afetivos, passando a dificultar ao máximo o contato do genitor alienado com o filho, explica a ex-desembargadora. Este vê o filho passar a odiá-lo e evitar contato, muitas vezes tendo o discurso de que ele não é um bom cuidador, recusando as visitas ou as vivenciando como um sacrifício. E enfatiza: “O genitor alienado vê sua relação com o filho escorrer pelos dedos”.
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Sinais de alienação parental
Alguns comportamentos característicos da alienação parental e que podem caracterizar uma criança em risco emocional:
- Depreciação: insultos ou desvalorização do outro genitor na frente da criança, mencionando assuntos internos do casal.
- Manipulação: descrição de situações ruins do divórcio quando o ex-cônjuge não estiver presente, destruindo a empatia do infante por ele.
- Isolamento: não permite o direito de coexistência da criança com o outro progenitor, com a finalidade de ser fonte exclusiva de amor.
- Ridicularização e humilhação: quebra a admiração do filho e seus sentimentos em relação ao outro progenitor.
Resultado desastroso
O objetivo da alienação parental é que a parte mais fraca da relação tome partido de um dos cônjuges, ficando contra o outro, todavia não se atenta ao mal que ocasionou ao filho, aos danos psíquicos que lhe infringiu. “O resultado pode ser desastroso”, pontua.
Igualmente, é criminosa toda forma de abuso que põe em risco a saúde emocional de uma criança. Ela acaba passando por uma crise de lealdade, pois a lealdade para com um dos pais implica deslealdade para com o outro. Dias explica que gera um sentimento de culpa quando, na fase adulta, o filho constatar que foi cúmplice de uma grande injustiça.
Hoje a alienação parental é vista como uma forma de maus-tratos infantil, uma vez que diagnosticado, pode ter consequências legais e sérias. A terapia familiar é necessária para reverter os problemas causados à criança, enfatiza a psicóloga Thaiana Filla Brotto:
Entre eles estão a dificuldade em confiar em outras pessoas; baixa autoestima, dificuldade em sustentar relacionamentos íntimos; depressão ou abuso de substâncias para aliviar a dor da alienação parental.
Por um lado percebe-se que em algumas crianças, há um apego extremo com um dos pais após a separação. E, no outro extremo, a criança que resiste e rejeita o outro pai. “E na maioria das vezes essa atitude é resultado de influência dos adultos responsáveis”, explica Thaiana.

Resgate dos laços
Para que aconteça o resgate dos laços, é indispensável a participação de psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais, com seus laudos, estudos e testes, segundo Maria Berenice Dias.
Ela pontua ainda que o juiz precisa distinguir o sentimento de ódio exacerbado que leva ao desejo de vingança, “a ponto de programar o filho para reproduzir falsas denúncias com o só intuito de afastá-lo do genitor”.
“É importante salientar que o acompanhamento psicológico não se restringe apenas à criança envolvida na alienação, mas pode-se demais partes envolvidas também merecem um olhar apurado do nosso campo do saber”, conclui Maria Berenice.
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