Book Appointment Now

Demência e linguagem: pesquisa brasileira identifica marcadores em exames simples
Estudo revela como testes fonoaudiológicos detectam a relação entre demência e linguagem. Identifique os sinais precoces da afasia primária progressiva, um tipo raro de demência que afeta a comunicação.
Demência e linguagem – A dificuldade para encontrar palavras, trocas semânticas (como dizer “cortador” em vez de “faca”) ou fonológicas (como confundir “faca” com “vaca”) podem ser os primeiros sinais de um tipo raro de demência: a afasia primária progressiva (APP).
Essa condição neurodegenerativa, que afeta inicialmente a linguagem, muitas vezes passa despercebida ou é confundida com outras síndromes, como o Alzheimer.
No entanto, um estudo conduzido na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) demonstrou que testes fonoaudiológicos específicos podem detectar precocemente a doença, permitindo intervenções mais rápidas e eficazes.
Publicado na revista PLOS ONE, o estudo apoiado pela FAPESP analisou o desempenho de pacientes com APP em comparação a indivíduos saudáveis, utilizando a Bateria Montreal-Toulouse de Avaliação da Linguagem (MTL-BR).
Os resultados revelaram quais tarefas são mais eficazes na identificação precoce da doença, abrindo caminho para um diagnóstico mais ágil e preciso.
Entendendo a afasia primária progressiva
Diferentemente da afasia causada por um AVC ou traumatismo craniano, a APP é uma doença degenerativa, que se instala de forma lenta e progressiva.
Seus primeiros sintomas envolvem dificuldades na fala, leitura e escrita, sem comprometimento inicial de outras funções cognitivas, como memória ou raciocínio lógico. Com o tempo, porém, a doença pode evoluir para um quadro demencial mais amplo, semelhante ao Alzheimer ou à demência frontotemporal.
A APP ganhou destaque em 2022, quando o ator Bruce Willis anunciou seu diagnóstico de afasia, que posteriormente evoluiu para demência. No Brasil, o cartunista Angeli também revelou ser portador da doença.
Esses casos chamaram atenção para um distúrbio ainda pouco conhecido, mas que impacta significativamente a qualidade de vida dos pacientes e suas famílias.
Demência e linguagem: o papel dos testes
A pesquisa da Unifesp avaliou 87 participantes, sendo 29 com diagnóstico de APP e 58 saudáveis, todos pareados por idade e escolaridade. Por meio da MTL-BR, os cientistas identificaram quais tarefas apresentavam maior discrepância entre os grupos, destacando-se:
- Entrevista dirigida (avaliação da comunicação espontânea)
- Compreensão oral e escrita de frases
- Discurso narrativo oral
- Fluência verbal (semântica e fonológica)
- Nomeação de objetos e ações
- Ditado e repetição de frases
“Essas tarefas mostraram diferenças marcantes entre os grupos, permitindo identificar os pacientes que necessitam de investigação mais aprofundada“, explica Karin Zazo Ortiz, professora da Unifesp e autora correspondente do estudo.
A MTL-BR é a única bateria de testes validada no Brasil para avaliação de distúrbios de linguagem de origem neurológica. No entanto, por ser extensa (com 22 tarefas), a identificação dos testes mais sensíveis pode agilizar o rastreio inicial, tornando-o mais acessível na prática clínica.
Leia também: Primeiros sinais de Alzheimer? Veja 07 sintomas que requerem atenção
Os desafios do diagnóstico
Um dos maiores obstáculos no diagnóstico da APP é sua heterogeneidade. A doença se manifesta em quatro variantes, cada uma com características distintas:
- APP não fluente/agramática: Dificuldade na estruturação gramatical das frases e compreensão de sentenças complexas.
- APP semântica: Comprometimento do significado das palavras, com trocas semânticas e dificuldade em ler e escrever termos irregulares.
- APP logopênica: Problemas na repetição de frases e omissão de sons na fala, com perfil semelhante ao Alzheimer.
- APP mista/não classificável: Quando o paciente apresenta características de mais de uma variante, dificultando a categorização.
“Essa complexidade exige avaliações detalhadas para diferenciar a APP de outras demências“, ressalta Ortiz. “Nosso estudo ajuda a direcionar quais testes são mais eficazes nessa distinção.“

A importância do diagnóstico precoce
Embora não exista cura para a APP, intervenções fonoaudiológicas precoces podem retardar a progressão dos sintomas, preservando por mais tempo a capacidade de comunicação do paciente. Além disso, o diagnóstico correto evita tratamentos inadequados e permite um planejamento terapêutico mais assertivo.
A próxima etapa da pesquisa buscará refinar ainda mais os marcadores linguísticos, identificando quais tarefas são mais relevantes para cada variante da doença.
Enquanto isso, os resultados já obtidos reforçam a importância da avaliação fonoaudiológica no contexto das demências, destacando-se como uma ferramenta valiosa para a medicina neurológica.
Para pacientes e familiares, a mensagem é clara: alterações persistentes na linguagem merecem atenção. Se erros na fala, escrita ou compreensão começam a se tornar frequentes, sem uma causa aparente, buscar avaliação especializada pode fazer toda a diferença no manejo da doença.
Leia mais: Alimentos bons para o coração ricos em potássio ajudam a reduzir a pressão arterial, aponta estudo