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Você pode estar envelhecendo mais rápido por causa da polarização política, diz estudo
Envelhecimento acelerado – A maneira como um país é governado (e o nível de polarização política que atinge sua população) pode estar afetando diretamente o envelhecimento do cérebro e do corpo. É o que aponta um estudo internacional publicado na revista Nature Medicine, com a participação de cientistas brasileiros.
A pesquisa revela que fatores como desigualdade social, poluição do ar, instabilidade institucional e baixa confiança no governo estão associados ao envelhecimento acelerado, principalmente em países com democracias frágeis.
Segundo os autores, o ambiente político e social exerce um papel profundo sobre a saúde da população ao longo da vida.
A ideia de que envelhecer mais rápido depende apenas da genética ou do estilo de vida está sendo ampliada.
De acordo com o estudo, o local onde uma pessoa vive, incluindo seus níveis de liberdade, coesão social e estabilidade política, pode influenciar fortemente o ritmo do envelhecimento biológico.
Como o estudo mediu o envelhecimento acelerado
O estudo analisou dados de mais de 160 mil pessoas em 40 países diferentes, inclusive o Brasil.
Para entender o nível de envelhecimento acelerado de cada indivíduo, os pesquisadores usaram ferramentas avançadas de inteligência artificial e modelagem estatística.
Eles criaram um indicador chamado “diferença de idade biocomportamental” (BBAG, na sigla em inglês).
Esse índice compara a idade real de uma pessoa com a idade estimada com base na saúde física, mental, escolaridade, funções cognitivas e presença de doenças.
Quando a idade estimada pela saúde e comportamento é maior do que a idade cronológica, isso indica envelhecimento acelerado.
E esse padrão foi mais comum em países marcados por altos níveis de poluição, desigualdade e instabilidade política.
O papel da desigualdade e da pobreza no envelhecimento
Entre os fatores mais associados ao envelhecimento acelerado estão os níveis de desigualdade social e econômica.
Em países com baixa renda, o envelhecimento tende a ocorrer de forma mais rápida.
Isso acontece porque a pobreza costuma vir acompanhada de dificuldades de acesso à saúde, alimentação inadequada, baixa escolaridade e maior exposição a ambientes degradados.
No Brasil, por exemplo, os resultados mostraram que estamos no meio do caminho: nem entre os países com envelhecimento mais rápido, como Egito e África do Sul, nem entre os que envelhecem de forma mais lenta, como algumas nações europeias e asiáticas.
Ainda assim, a desigualdade brasileira é um dos fatores mais preocupantes e impacta diretamente a saúde mental e física da população.
Poluição e falta de acesso à saúde estão entre os fatores associados
Além da desigualdade, o estudo mostrou que a exposição prolongada à má qualidade do ar foi associada a maiores índices de envelhecimento acelerado, o que pode impactar o sistema cardiovascular e o cérebro, contribuindo para quadros de declínio cognitivo.
Os pesquisadores não afirmam uma relação de causa direta, mas os dados sugerem que há uma ligação entre o ambiente poluído e a aceleração do envelhecimento biológico.
Outros fatores associados incluem a baixa escolaridade, o acesso precário a serviços de saúde, a ausência de saneamento básico e a falta de políticas públicas que promovam o bem-estar da população.
A influência da polarização política e da instabilidade institucional
Um dos destaques mais inovadores da pesquisa foi demonstrar que a polarização política e a instabilidade institucional também estão associadas ao envelhecimento acelerado.
Segundo os cientistas, viver em países com alta corrupção, baixa confiança no governo e democracias frágeis pode gerar um ambiente de estresse social e político que afeta negativamente a saúde.
Esse estresse prolongado, de acordo com os autores, pode estar ligado ao aumento de doenças cardíacas, distúrbios mentais e piora da saúde geral da população.
O estudo aponta que a falta de representação política e os direitos democráticos limitados aparecem entre os elementos estruturais associados ao aumento da idade biocomportamental.
“A confiança no governo está associada a melhores condições de saúde, enquanto a desconfiança e a polarização política aumentam a mortalidade e enfraquecem as respostas de saúde pública”, escrevem os autores no artigo.
Outros fatores estruturais citados no estudo
O estudo também mencionou, de forma complementar, fatores como desigualdade de gênero, migração e exclusão social como aspectos que podem influenciar o envelhecimento em alguns contextos.
Embora esses temas não tenham sido o foco central da análise estatística, os pesquisadores os apontam como parte do ambiente estrutural que pode impactar a saúde ao longo da vida.
Especialistas brasileiros reforçam a importância do contexto social
O professor Eduardo Zimmer, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), um dos autores brasileiros do estudo, ressalta que o ambiente em que vivemos pode nos expor a fatores que aceleram o envelhecimento, principalmente em países como o Brasil, onde a desigualdade é profunda.
Ele afirma que os resultados têm grande importância para a formulação de políticas públicas voltadas à saúde da população.
Outro pesquisador brasileiro envolvido, Wyllians Borelli, também da UFRGS, explica que o estudo comprova algo que já era percebido, mas agora está respaldado por evidência estatística robusta.
Em outras palavras, o lugar onde uma pessoa nasce e vive influencia sua saúde cerebral ao longo da vida.
Ele lembra que a disparidade no acesso a recursos e à saúde entre regiões como Europa, África e América Latina tem consequências diretas no processo de envelhecimento populacional.
Ações coletivas são tão importantes quanto decisões individuais
Lucas da Ros, também da UFRGS e coautor do artigo, reforça que, antes de cobrar mudanças apenas no comportamento individual (como alimentação, exercícios ou controle do estresse), os governos precisam investir em reduzir as desigualdades sociais e melhorar a qualidade de vida das populações.
Segundo ele, só assim será possível garantir um envelhecimento mais saudável e justo para todos.
Além disso, Zimmer e Borelli publicaram outro estudo na revista Lancet Global Health mostrando que, no Brasil, a baixa escolaridade é o principal fator de risco para doenças cerebrais como o Alzheimer.
Essa condição está diretamente ligada à falta de oportunidades e ao acesso desigual à educação, o que reforça a importância de políticas públicas estruturais desde a infância.
Envelhecer com saúde depende do ambiente que nos cerca
O principal recado do estudo é que envelhecimento acelerado não é apenas uma questão de herança genética ou de escolhas pessoais.
O ambiente onde vivemos, incluindo fatores como desigualdade, instabilidade e exclusão social, tem um peso significativo no modo como envelhecemos.
Por isso, melhorar as condições de vida da população e garantir políticas públicas efetivas não é apenas uma questão social, mas também de saúde pública e bem-estar coletivo.
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