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Especialista alerta: “Luto parental não é apenas tristeza” e nova lei pode ajudar
Nenhuma mãe ou pai espera viver a experiência de perder um bebê. Até agora, não havia, no Brasil, uma lei que garantisse acolhimento e respeito nesse momento tão delicado.
No entanto, neste mês de agosto, isso muda com a entrada em vigor da Lei 15.139/2025, que estabelece direitos e orienta práticas para que o luto parental seja tratado com dignidade.
No Brasil, a cada mil nascimentos, cerca de dez resultam em óbito neonatal. Aproximadamente 20% das gestações terminam em aborto espontâneo.
No mundo, dois milhões de bebês nascem sem vida por ano (um natimorto a cada 16 segundos) e quase metade das mortes infantis acontece no primeiro mês de vida.
Esses números mostram que o luto parental não é raro e reforçam a urgência de acolher essas famílias com dignidade e respeito.
Ao longo da minha trajetória, ouvi histórias de famílias que atravessaram essa dor sozinhas. Algumas não puderam segurar o bebê. Outras saíram do hospital sem explicações claras sobre o que aconteceu. Muitas não tiveram a chance de se despedir.
Esses relatos evidenciam como a falta de preparo e de protocolos agrava o sofrimento e deixa marcas que se estendem por toda a vida.
O que muda com a nova lei sobre o luto parental
A Lei 15.139/2025 traz mudanças importantes. Ela garante que os pais possam ter contato com o bebê, se assim desejarem.
Prevê o direito de receber informações completas sobre a causa da morte e de viver a despedida com privacidade.
Também assegura o acesso a suporte psicológico especializado e determina a capacitação das equipes de saúde para lidar com essas situações com ética, sensibilidade e respeito.
O luto parental não é apenas tristeza. É uma ruptura profunda, que pode levar à depressão, à ansiedade e ao transtorno de estresse pós-traumático.
A forma como a perda é conduzida influencia diretamente a capacidade da família de elaborar o luto e seguir vivendo.
Quando existe acolhimento, a dor continua, mas encontra um espaço para ser vivida sem isolamento.
Como oferecer acolhimento no luto parental
O primeiro passo para cuidar de quem vive essa experiência é reconhecer a existência do bebê e validar a dor da família.
Não importa se a gestação estava no início ou se o bebê viveu apenas alguns minutos, o vínculo já existia.
Frases como “vocês são jovens, podem tentar de novo” ou “pelo menos foi cedo” não ajudam. Elas silenciam quem mais precisa falar.
Com a lei em vigor, as famílias agora têm respaldo para exigir respeito e cuidado.
Para os profissionais, é um chamado para rever práticas e entender que acolher não é um gesto opcional, mas parte fundamental do atendimento.
Isso significa respeitar o tempo da família, oferecer informações claras e garantir que a despedida seja feita com dignidade.
Nenhuma lei muda sozinha a cultura de um país. Mas a Lei 15.139/2025 cria um marco. Define um padrão mínimo de cuidado e envia uma mensagem: práticas desumanas não serão mais aceitas.
É um avanço que pode inspirar mudanças na formação dos profissionais, na gestão das instituições e na forma como a sociedade encara o luto parental.
Um caminho para humanizar o luto parental no Brasil
Perder um filho é uma dor que nunca desaparece. Mas ela pode, e deve, ser acolhida com humanidade.
Que essa lei seja o início de um caminho em que nenhuma família precise atravessar essa experiência sem amparo. Porque o cuidado começa no respeito à vida e continua no respeito à despedida.
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Rafaela Schiavo é psicóloga perinatal e fundadora do Instituto MaterOnline. Dedica-se à saúde mental materna desde sua formação inicial, sendo autora de centenas de trabalhos científicos voltados à redução dos altos índices de sofrimento emocional durante a gestação e o puerpério.